Aprenda a lidar com a autocrítica e desenvolva uma conversa interna mais produtiva.
Lidar com a autocrítica é o mesmo que aprender a se ouvir.
É entender que a forma como nos vemos, como vemos aos outros e como acreditamos que os outros nos veem não é resultado da (suposta) verdade — e sim, de nossos pensamentos.
Perceba: nos avaliamos o tempo todo, em pequenos detalhes.
Nos comparamos — com os outros, com nossas expectativas e as lembranças de quem já fomos.
É assim que formamos nosso entendimento de identidade.
Acontece que a “voz” dos pensamentos é rápida e, por vezes, sutil.
Estamos tão acostumados que nem a notamos.
Mas é ela que determina como nos sentimos, como agimos e como interpretamos todas as experiências da vida.
”A força mais influente que controla suas atitudes, crenças, capacidades e emoções é a repetição — as palavras que você usa silenciosamente, continuamente, em seu diálogo interno consigo mesmo.” — Napoleon Hill
Assim, nossa relação com a autocrítica — a opinião que temos sobre nossas características físicas, personalidade, realizações e capacidades — depende dos pensamentos que, às vezes, sem perceber, estamos cultivando.
Na verdade, a maior parte de nossos pensamentos (negativos ou positivos) são automáticos. Ou seja, são hipóteses e julgamentos que repetimos, por puro hábito.
Então, para lidar com a autocrítica de modo mais inteligente, o primeiro passo é buscar consciência sobre essa “conversa interna”.
“O crítico interno realmente quer que você esteja bem. Ele realmente quer que você ganhe espaço no mundo, tenha um bom emprego e ganhe dinheiro suficiente. Ele realmente quer que você seja amado, tenha sucesso, seja aceito, tenha uma família.
Ele foi desenvolvido em seus primeiros anos para proteger sua vulnerabilidade, ajudando-o a se adaptar ao mundo ao seu redor e a atender a seus requisitos, sejam eles quais forem.
Para realizar seu trabalho de maneira adequada, ele precisava conter suas inclinações naturais e torná-lo aceitável para os outros, criticando e corrigindo seu comportamento antes que outras pessoas pudessem criticá-lo ou rejeitá-lo. Dessa forma, poderia ganhar amor e proteção para você, bem como poupar-lhe muita vergonha e mágoa.
No entanto, o crítico interno muitas vezes não sabe quando parar. Não sabe quando é o suficiente. Tem a tendência de crescer até ficar fora de controle e começar a nos prejudicar e a causar danos reais. Sua intenção original se perde nas areias do tempo.
Como um agente da CIA bem treinado, o crítico interno aprendeu a se infiltrar em cada parte de sua vida, examinando você nos mínimos detalhes, em busca de fraquezas e imperfeições.
Como sua principal função é protegê-lo de ser muito vulnerável no mundo, ele deve saber tudo sobre você, tudo que possa estar aberto a ataques externos.
Mas, como um agente renegado da CIA, em algum ponto, o crítico ultrapassa seus limites, resolve o problema por conta própria e começa a operar de acordo com sua própria agenda.
A informação, que originalmente deveria ser para sua defesa geral e para promover seu bem-estar, agora está sendo usada contra você — a própria pessoa que o crítico interno deveria proteger.
Com os objetivos e propósitos originais do crítico esquecidos, tudo o que resta é a excitação da perseguição e o sentimento maravilhosamente triunfante da conquista, já que opera secreta e independentemente de qualquer controle externo.
Quando o crítico começa a superar sua utilidade inicial dessa maneira, há problemas reais. Nesse ponto, o crítico interno faz você se sentir péssimo consigo mesmo. Com o seu crítico interno observando cada movimento seu, você se torna constrangido, estranho e cada vez mais temeroso de cometer um erro. Você pode até parar de tentar, porque o crítico lhe diz que você está fazendo tudo errado e, sem dúvida, fracassará.
Embora, por trás de tudo isso, o crítico queira que você seja tão perfeito que não falhará, seu efeito é bloquear qualquer tentativa que você possa fazer. O crítico interno mata sua criatividade.” — Hal Stone
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Lidar com a autocrítica… por quê?
A autocrítica pode levar a dois caminhos.
Quando as avaliações que temos sobre nós são ativas, quando servem para enxergar — com honestidade — onde podemos fazer diferente, elas são a própria essência do autodesenvolvimento.
Nesse caso, a autocrítica não é resignada. Dói — porque assumir, para si, erros e falhas, é sempre (no mínimo) constrangedor. Mas a dor serve como ensinamento e instiga a vontade de mudança.
“Se os bebês tivessem a mesma tendência para a autocrítica que os adultos, talvez nunca aprendessem a andar ou falar. Você pode imaginar bebês batendo os pés, ‘Aarggh! Estraguei tudo outra vez!’. Felizmente, os bebês estão livres de autocrítica. Eles apenas continuam praticando.” — Dan Millman
O outro caminho é o exato oposto. Nele, a autocrítica é uma sentença autopunitiva, que vê no “defeito” um olhar definitivo sobre si.
Nesse caminho, a autocrítica vira um rótulo autoimposto. Um autopreconceito.
Leva à estagnação. Ao cultivo da ideia de impotência, culpa e vergonha.
Lidar com a autocrítica é perceber que sempre existem esses dois caminhos.
Um, que estimula à superação. Outro, que aprisiona na autodepreciação.
A questão é: qual você escolhe?
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Lidar com a autocrítica de um modo diferente é possível
Não se abale se você percebe que sua autocrítica costuma ser do tipo disfuncional.
Aliás, se percebeu isso, já deu o primeiro passo para modificá-la.
Como falamos no início do texto, a consciência de nossos pensamentos é o que nos permite analisá-los, colocá-los em dúvida e reformular pontos de vista.
Ok, então, qual o próximo passo?
Experimente isto:
1. Substitua afirmações por perguntas
Sabe todos aqueles adjetivos que você deu para si, ao longo dos anos, e que lhe incomodam? Aquelas coisas que você diz (secreta ou abertamente) sobre si mesmo e que, de alguma forma, o diminuem?
Hora de desafiar essas “verdades”!
Pensamentos são hipóteses que sua criação, educação, cultura e experiências pessoais proporcionam. Ou seja, são reflexos de suas crenças.
Pegue cada pensamento autodepreciativo e o questione.
Ele se sustentaria se você mudasse seu modelo de referência?
Você é inadequado, azarado, incompetente… ou apenas está preso numa crença limitante?
Seja seu próprio advogado e, em vez de aceitar acusações, coloque-as à prova, ou seja avalie melhor suas atitudes.
“Não seja uma vítima de seus pensamentos.” — Darlene Lancer
2. Procure explicações, não culpas (ou desculpas)
Ao lidar com a autocrítica, podemos cair na armadilha de transformá-la num ritual de autoflagelo — ou de vitimização.
Em ambos os casos, o sujeito se vê como refém — seja das circunstâncias ou do que julga ser sua “natureza” imutável.
“A maneira como você pensa tem o poder de se tornar uma profecia autorrealizável”, diz Amy Morin, psicoterapeuta e autora do best-seller 13 coisas que as pessoas mentalmente fortes não fazem.
Se você assume que tem “azar no amor”, por exemplo, pode, inconscientemente, fazer escolhas que confirmem esse entendimento.
Tire um momento para refletir, revise suas ações, veja se não existem hábitos prejudiciais envolvidos na sua “má sorte”.
“Nossa reação à autocrítica é mais importante do que a autocrítica em si. Prestar atenção às nossas reações é muito importante porque a única coisa sobre a qual temos controle é como reagimos.” — Yong Kang Chan
3. Demita seu atual crítico interno
De um jeito ou de outro, você terá que lidar com a autocrítica.
Não há truque para fazê-la “desaparecer” — e esse nem seria um bom objetivo.
Mas você pode identificar de quem são as vozes que seu crítico interno ecoa.
Tente localizar a origem das opiniões que você tem a seu respeito.
São reflexos de comentários negativos que ouviu de seus pais? De um professor? De seu chefe? De um amigo ou de um parceiro amoroso?
Elas foram construídas com base em quais figuras de autoridade?
Você pode se surpreender ao constatar que se acha “feio” porque aceitou esse veredicto em função de uma rejeição que sofreu no ensino médio!
Experimente buscar outras referências, que desafiem os estigmas que você adotou para se avaliar.
Troque a “régua” que você usa para se medir! São os critérios que você estabelece como válidos que determinam os resultados de sua autocrítica.
Então, certifique-se de escolher esses critérios com sabedoria.
”Todos nós temos a tendência de acreditar na dúvida e na autocrítica, mas ouvir essa voz nunca nos aproxima de nossos objetivos. Em vez disso, tente o ponto de vista de um mentor ou bom amigo que acredita em você, quer o melhor para você e o encorajará quando você se sentir desanimado.” — Kelly McGonigal
Por último, uma provocação:
Já que somos o que pensamos, será que não mudaremos quem somos ao mudar de pensamentos?
Reflita sobre isso!
“Abaixe o volume de sua voz interior negativa e crie uma voz interior estimulante para o ocupar o seu lugar. Quando você cometer um erro, perdoe-se, aprenda com ele e siga em frente, em vez de ficar obcecado por ele.” — Beverly Enge
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- 7 sinais de que você é muito autocrítico;
- 4 dicas extras para lidar com a autocrítica de maneira mais produtiva.
Se tiver dúvidas sobre o comportamento de autocrítica ou quiser compartilhar sua experiência com outros leitores, fique à vontade para escrever no campo dos comentários!
Luana Nodari
Psicóloga na Vila Mariana
Atende adolescentes e adultos,
através da Terapia Cognitivo-Comportamental
CRP: 06/112356